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terça-feira, 2 de julho de 2013

Tratamento do Tabagismo - Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia



Esta atualização representa um forte compromisso da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia com a cessação do tabagismo, pois fornece aos profissionais de saúde um instrumento abrangente sobre os principais aspectos ligados à dependência do tabaco. 


A dependência do tabaco é cada vez mais reconhecida como uma condição crônica que pode necessitar de repetidas intervenções. Além disso, evidências recentes embasam o papel fundamental do aconselhamento tanto em intervenção isolada ou em grupo quanto associada ao tratamento farmacológico.


Foi empregado o método de seleção baseado em evidências para a busca de referências na literatura especializada,  seguido de revisão crítica por pares que, ao final, apresentaram suas recomendações.

A decisão de adotar quaisquer destas orientações deve ser tomada pelo profissional, levando em consideração os recursos disponíveis em seu local de atuação e as circunstâncias específicas apresentadas pelo paciente. Embora este documento apresente as principais recomendações para cada situação, devido à limitação do espaço para publicação são fornecidas referências adicionais que permitirão aos interessados aprofundar seu conhecimento científico no assunto.

Estas diretrizes constituem uma ferramenta atualizada e abrangente para auxiliar o profissional de saúde na abordagem do tabagista, seja nas unidades públicas de saúde ou na clínica privada.

Deve-se enfatizar o papel do estado e das políticas públicas no reconhecimento do tabagismo como um problema de saúde pública para que o tratamento seja disponibilizado a todos os fumantes, tanto no Sistema Único de Saúde quanto no Sistema de Saúde Suplementar.

Orientação para interpretar o nível de evidência

As referências bibliográficas são citadas numericamente por ordem de entrada no texto, seguidas do grau de recomendação A, B, C ou D, onde couber. A classificação do grau de recomendação, que corresponde à nível de evidência científica do trabalho, foi fundamentada com base nos Centros de Medicina Baseada em Evidências, particularmente o Centro Cochrane—Cochrane Review,(1) em estudos de meta-análise, em ensaios clínicos randomizados publicados em revistas nacionais e internacionais e na recente revisão do Surgeon General, publicada em maio de 2008.(2)

 Todos os graus de recomendação, incluindo o "D", baseiam-se em evidências científicas. As diferenças entre as forças de evidência A, B, C e D devem-se exclusivamente ao desenho empregado na geração da evidência.

A correspondência entre o grau de recomendação e o nível de evidência científica está resumida a seguir:

a) estudos experimentais ou observacionais de melhor consistência
b) estudos experimentais ou observacionais de menor consistência
c) relatos de caso e estudos não controlados
d) opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos, estudos fisiológicos ou modelos animais

A utilização do grau de recomendação associado à citação bibliográfica no texto tem como objetivos principais: conferir transparência à procedência das informações; estimular a busca da evidência científica de maior força; e introduzir uma forma didática e simples de auxiliar na avaliação crítica do leitor, que é quem arca com a responsabilidade da decisão frente ao paciente que orienta.

Abordagem diagnóstica
Avaliação clínica

O fumante deve ser submetido a avaliação clínica no momento da admissão no programa de cessação do tabagismo. O objetivo é identificar alterações funcionais pulmonares, existência de doenças relacionadas ao tabagismo (DRT), possíveis contra-indicações e interações medicamentosas durante o tratamento farmacológico da dependência. É neste momento que também é avaliado o perfil do fumante, seu grau de dependência à nicotina e sua motivação para deixar de fumar.

A avaliação deve incluir história clínica minuciosa, exame físico completo e alguns exames complementares, dependendo da disponibilidade dos recursos diagnósticos locais.

A realização da radiografia de tórax é fundamental durante o tratamento. A boa relação médico-paciente, a sensibilidade e a capacidade de observação do profissional apontarão a hora mais adequada. Algumas pessoas têm receio do que pode ser encontrado, por vezes se afastando do atendimento para não enfrentar a situação.

História tabagística
Idade de início, número de cigarros fumados por dia, tentativas de cessação, tratamentos anteriores com ou sem sucesso, recaídas e prováveis causas, sintomas de abstinência, exposição passiva ao fumo, formas de convivência com outros fumantes (casa/trabalho) e fatores associados (café após as refeições, telefonar, consumo de bebida alcoólica, ansiedade e outros).
Grau de dependência
Teste de Fagerström para dependência à nicotina.
Grau de motivação
Estágio motivacional (Modelo transteórico comportamental de Prochaska e DiClemente). Atividade física habitual e oscilações do peso corporal.
• Sintomas
Tosse, expectoração, chiado, dispnéia, dor torácica, palpitações, claudicação intermitente, tontura e desmaios.
• Investigação de co-morbidades
Doenças prévias ou atuais que possam interferir no curso ou no manejo do tratamento: lesões orais, úlcera péptica, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, cardiopatias, transtornos psiquiátricos (depressão, ansiedade, pânico, anorexia nervosa, bulimia, etc.), uso de álcool e/ou outras drogas, pneumopatias, epilepsia, AVE, dermatopatias, câncer, nefropatias, hepatopatias, história de convulsão, entre outras.
Medicamentos em uso
Levantamento dos medicamentos que possam interferir no manejo do tratamento, como antidepressivos, inibidores da MAO, carbamazepina, cimetidina, barbitúricos, fenitoína, antipsicóticos, teofilina, corticosteróides sistêmicos, pseudo-efedrina, hipoglicemiante oral e insulina, entre outros.
Alergias
De qualquer etiologia, como cutâneas, respiratórias e medicamentosas.
Situações que demandam cautela
Principalmente as relacionadas ao uso de apoio medicamentoso, por exemplo, gravidez, amamentação, IAM ou AVE recente, arritmias graves, uso de psicotrópicos e outras situações. Recomenda-se cautela também com os adolescentes e idosos.
Antecedentes familiares
Avaliar problemas de saúde familiares, principalmente se relacionados ao tabagismo, em especial a existência de outros fumantes que convivam com o paciente.
• Exame físico
Sempre completo, buscando sinais que possam indicar existência de doenças atuais ou limitações ao tratamento medicamentoso a ser proposto.
Exames complementares
Rotina básica: radiografia de tórax, espirometria pré e pós broncodilatador, eletrocardiograma, hemograma completo, bioquímica sérica e urinária. Medidas do COex e da cotinina (urinária, sérica ou salivar) são úteis na avaliação e no seguimento do fumante e devem ser utilizadas, quando disponíveis.

A demanda inclui desde pessoas "saudáveis", que procuram apoio apenas para deixar de fumar, até pessoas que já apresentam sinais e sintomas de DRT ou de outras co-morbidades, incluindo algumas gravemente enfermas, buscando reconquistar a saúde e/ou qualidade de vida.

A avaliação clínica inicial é semelhante em todos os grupos. A forma de abordagem é que deve ser diferenciada e será discutida adiante, neste documento.

Os exames complementares podem ser úteis para auxiliar na motivação do paciente para a cessação do tabagismo. Quando os resultados são normais, tranqüilizar e indicar que esta é a melhor hora para deixar de fumar, pois ainda não apresenta as DRT. Se alterados, podem servir de alerta: é melhor parar, impedindo novos danos, e tentar reconquistar a saúde. Evidências sobre o impacto de medidas como esta e outras na condução dos casos serão discutidas também em outros capítulos

Avaliação do grau de dependência

 

Um dos primeiros instrumentos desenvolvidos para avaliar a dependência à nicotina foi o Fagerström Tolerance Questionnaire (FTQ, Questionário de Tolerância de Fagerström), constituído de oito questões.(3) Um estudo posterior sugeriu um índice denominado heaviness of smoking index (HSI), resultante da combinação das medidas relacionadas ao tempo para consumir o primeiro cigarro do dia e o consumo médio diário de cigarros.(4)
O índice HSI foi considerado na revisão do FTQ, levando à versão de seis perguntas conhecida como o Fagerström test for nicotine dependence (FTND, teste de Fagerström para a dependência à nicotina),(5) que é amplamente utilizada na avaliação da dependência à nicotina (Quadro 2). Uma soma acima de seis pontos indica que, provavelmente, o paciente terá desconforto significativo (síndrome de abstinência) ao deixar de fumar.(6)
Outros critérios aplicáveis ao diagnóstico da dependência à nicotina são os do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (Manual Estatístico e Diagnóstico das Desordens Mentais), em suas 3ª e 4ª edições (DSM-III e DSM-IV, respectivamente).(7,8) Com a exceção dos sintomas de abstinência específicos da nicotina descritos no DSM-IV, os critérios de dependência são aplicáveis a uma ampla gama de substâncias psicoativas.
A vantagem do FTQ é que ele foi desenvolvido especificamente para avaliar a dependência física à nicotina. As correlações entre o FTQ/FTND e o diagnóstico de dependência à nicotina pelo DSM-IV são baixas a moderadas, sugerindo, então, que esses instrumentos capturam dimensões diferentes da adição à nicotina. Os critérios do DSM-IV são apresentados no Quadro 3.
Os itens que correspondem ao uso, em geral, de substâncias psicoativas compreendem os critérios do DSM-IV para dependência à nicotina, os quais incluem tolerância e seis outros critérios. Assim, o próprio indivíduo percebe que o comportamento de uso da nicotina já se tornou um problema que afeta, de algum modo, a sua vida. Já no FTND os itens são mais objetivos.

Deve-se ter em mente a complexidade da dependência à nicotina, e ainda que estão sendo desenvolvidos instrumentos que consigam captar as suas várias dimensões. No momento ainda não existem medidas de dependência à nicotina que


1. Quanto tempo após acordar você fuma seu primeiro cigarro?
(3) nos primeiros 5 minutos
(2) de 6 a 30 minutos
(1) de 31 a 60 minutos
(0) mais de 60 minutos
2. Você acha difícil não fumar em lugares proibidos?
(1) sim
(0) não
3. Qual o cigarro do dia que traz mais satisfação?
(1) o 1° da manhã
(0) os outros
4. Quantos cigarros você fuma por dia?
(0) menos de 10
(1) 11-20
(2) 21-30
(3) mais de 31
5. Você fuma mais freqüentemente pela manhã?
(1) sim
(0) não
6. Você fuma mesmo doente, quando precisa ficar acamado a maior parte do tempo?
(1) sim
(0) não
Total: 0-2 = muito baixa; 3-4 = baixa; 5 = média; 6-7 = elevada; 8-10 = muito elevada



incorporem os parâmetros dos processos neuropatológicos subjacentes e que determinem a sua severidade.

Outros meios para avaliar a dependência à nicotina são os testes para medir o seu principal metabólito—a cotinina—e o monóxido de carbono no ar expirado (COex). Esses testes são muito úteis, quando disponíveis, para monitorar os progressos alcançados pelo fumante em avaliações seriadas. Na determinação da cotinina salivar, sérica e urinária, o ponto de corte para fumantes ativos é considerado a partir de valores acima de 10, 15 e 100 ng/ml, respectivamente.(9-11) Em geral, os níveis de cotinina se correlacionam bem com a intensidade de dependência medida pelo FTND.(9,10)


A mensuração do COex é um indicador de fácil emprego, baixo custo, não invasivo e que permite a obtenção de resultado imediato, com o valor de corte do COex acima de 6 ppm apresentando boa especificidade para aferir o hábito tabágico.

 

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