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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Ministério Público X FIFA: álcool na Copa no Brasil?

Para promotores, a possível liberação da venda de bebidas alcoólicas nos jogos da Copa é retrocesso

Gazeta do Povo - VANESSA PRATEANO

Regras em vigor

Veja como avançou a proibição no país e qual é o temor do MP:

Estatuto do Torcedor

O artigo 13 prevê que o torcedor não pode “portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência” em estádios.

Regulamentações

Antes de 2010, quando a lei de 2003 foi regulamentada, o que prevalecia era o protocolo de intenções firmado pela CBF e as legislações estaduais e municipais ou Termos de Ajustamento de Conduta para jogos das federações.

Lei geral

Após 2010, a lei federal suplanta todas as demais e, para que a Fifa possa comercializar cerveja dentro dos estádios, será preciso que o Congresso suspenda ou invalide o artigo atual. Isso também pode ocorrer via Medida Provisória, emitida pelo Executivo.

Risco

O receio do Ministério Público é que, ao ser suspenso, o artigo perca força, e isso abra precedentes para que a CBF e as federações exijam a liberação nos jogos de sua competência, sepultando a lei.

Médicos criticam ação

A possível mudança da lei provocou reações entre a comunidade científica e médica. A Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead) tem se posicionado contra a mudança desde 2009, quando o órgão soltou uma nota criticando a postura da Fifa e a intenção da CBF de apoiar a entidade internacional.

O presidente da Abead, o psiquiatra gaúcho Carlos Salgado, afirma que ficou chocado com a notícia. “Como cidadão, eu lamento o recuo do poder público diante do poder econômico. E como médico, igualmente, pois a medida tem efeito comprovado e amplo apoio da comunidade científica e da população.”

O psiquiatra Dagoberto Requião, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, lembra que, por ser uma droga depressora da atividade cerebral, o álcool diminui a noção de autocrítica da pessoa, fazendo com que ela aja por meio de estímulos do grupo. “Num ambiente com tanta gente, a personalidade já se dilui rapidamente. Com o estímulo do álcool, isso se potencializa e podem surgir confrontos.”

O médico paranaense critica duramente a medida. “Seria como permitir que, durante a Copa, os motoristas pudessem cometer infrações sem receber punição. Uma vergonha.”

Segurança

País tem regras contraditórias

Pelo artigo 17 do Estatuto do Torcedor, cada entidade organizadora de eventos esportivos no país precisa elaborar um plano de segurança para garantir o bem-estar e o conforto dos torcedores, o que envolve desde o transporte e acomodação até a alimentação. Nos níveis nacional e estadual, os planos de segurança da CBF e das federações estão contemplados em protocolos de intenções e em Termos de Ajustamento de Conduta.

No caso da Fifa, o plano equivale a um Caderno de Diretrizes de Segurança, elaborado pela entidade. O que intriga o Ministério Público é que um caderno publicado em 2004 proíbe o consumo de álcool nos estádios, mas um caderno posterior, de 2008, libera a prática. No momento, mesmo com movimentações do Ministério dos Esportes no sentido de ceder à pressão da entidade, o MP espera que a lei em prática seja respeitada.

Para o procurador de justiça José Antônio Baeta, a pressão feita pela Budweiser acarretaria mais prejuízos do que benefícios, pois iria na direção contrária de uma medida consolidada e apoiada pela população.

Retrocesso. Este é o termo que vem sendo utilizado por membros do Ministério Público (MP) de todo o país para qualificar a possível suspensão, durante a Copa do Mundo de 2014, da legislação que proíbe a venda e o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios brasileiros.

A polêmica surgiu após o ministro dos Esportes, Orlando Silva, declarar que o Estatuto do Torcedor, de 2003, pode deixar de vigorar durante o torneio para atender a um pedido da Federação Internacional de Futebol (Fifa). Um dos patrocinadores da Copa é a cervejaria belgo-brasileira Budweiser.

Desde 2008, nos jogos das séries A e B do Campeo­nato Brasileiro, nenhum torcedor pode consumir bebida de teor alcoólico dentro dos estádios. Naquele ano, a Confe deração Brasileira de Futerbol (CBF) assumiu o compromisso de cumprir a lei ao assinar um protocolo de intenções junto ao Conselho Nacional de Procura dores-Gerais de Justiça (CNPG).

Avanço ameaçado

Para o promotor do Ministério Público paulista Paulo Castilho, o artigo 13-A da lei, que determina a proibição, é um avanço num país onde casos de violência no futebol ainda são recorrentes. “É sabido que o álcool num ambiente de competição ge ra violência. Isso já está provado. A mudança, sem dúvida ne nhuma, será um retrocesso”, avalia ele, que já afirmou que entrará com ações para fazer valer a lei.

O procurador de Justiça do MP de Minas Gerais José Antônio Baeta, coordenador nacional da Comissão Permanente de Prevenção e Combate à Violência nos Estádios de Futebol do CNPG, conta que, em 2006, quando a proibição foi adotada em Minas, o número de ocorrências baixou para zero dentro dos estádios.

Na capital mineira, um estudo da PM mostrou que foi necessário aumentar em 30% o efetivo policial feminino para revistar o maior número de mulheres que passou a ir aos jogos. O tempo de dispersão dos torcedores na saída das partidas passou de 70 para 30 minutos em média. “Essa lei é uma das mais avançadas do mundo. Não tenho dúvidas de que se for suspensa, potencializará a violência.”

Legitimidade

O receio do órgão é que, ao ceder à Fifa, o governo tenha de manter a exceção quando a Copa terminar. “A lei pode perder a força e a legitimidade. Se permitimos o ato por parte de uma entidade que vem de fora, como proibir a CBF e as federações de fazer o mesmo?”, indaga a promotora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor do MP-PR Cristina Ruaro. “Com a suspensão da lei, abre-se um estado de exceção.”

Para Cristina, há outro aspecto que fere não apenas o Estatuto, mas a Constituição: por contrato, apenas a Budweiser pode ser comercializada nos estádios, o que colocaria em risco o princípio de livre-concorrência. “O que temos de refletir é: até que ponto vamos aceitar isso? A Copa é um desejo de todos os brasileiros, mas não pode ser realizada a qualquer custo.”

O governo brasileiro está inclinado a ceder à Fifa e permitir a venda de bebidas alcoólicas em estádios durante a Copa do Mundo de 2014. A concessão viria com algum condicionante de pequeno impacto, como proibir a comercialização apenas nos minutos finais das partidas, quando os torcedores estão prestes a deixar os estádios.

O consumo de álcool em em eventos esportivos é vedado por legislações estaduais. O Estatuto do Torcedor, uma lei nacional, diz que é proibido o "ingresso de pessoa com bebidas e substâncias que possam causar a prática de atos de violência. "Contudo, a Fifa tem entre seus principais patrocinadores uma empresa de cerveja e insiste na liberação para garantir visibilidade e pontos de venda exclusivos ao parceiro.

Em audiência na Câmara o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, sustentou que a venda não causa incidentes graves, desde que seja feita com regras.

- É verdade que limitar o álcool reduz muito os atos de violência. Mas, na Alemanha e na África do Sul, a venda controlada nunca provocou problemas. Temos esse acordo com a Budweiser. A bebida não pode ser distribuída em garrafas, mas copos de plástico - exemplificou.

Valcke explicou que a Rússia, cuja legislação considera mais rigorosa que a do Brasil, entendeu que a Copa é um evento privado e, por sua condição especial, liberou o consumo nos estádios em 2018.

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